A capacidade de diferenciar os passarinhos através dos sons deve ser treinada e estimulada, eu (Rita) posso garantir que qualquer pessoa (com sistema auditivo operante) consegue tal proeza.
Essa é uma habilidade que pode ser aprendida e para começar este assunto, é importante compreender que apesar da comunicação das aves ser um processo biológico, a onda sonora é essencialmente física.
Entretanto, o que é o som?
Prepara que agora vem a aula de física: O SOM É O AR EM MOVIMENTO e o que influencia cada ruído é a pressão sobre a massa de ar, que pode ser imperceptível aos ouvidos humanos.
Há muita troca de ideias entre os passarinhos que a gente nem imagina que está acontecendo.
Para o som existir, é necessário vibrar um “corpo”, no caso das aves, o órgão que ganha a tremulação (e responsável pela vocalização) é a siringe, mas urubu não tem siringe, então ele não canta, mas isso não quer dizer que a família Cathartidae não se comunique, pelo contrário.
Os urubus são bem sociáveis entre si (relação intraespecífica) e até com outras espécies (interespecífica).
As aves podem produzir sons graves, na faixa de 80 Hz (unidade de medida Hertz) e também agudos, com até incríveis 18.000 Hz. A frequência da voz de muitos Passeriformes correspondem à tecla mais alta de um piano (4.000 Hz).
Assim, os “cantos dos passarinhos” são como as músicas, com tons, notas, timbre, frequência, tempo e propagação do som, isto é, a percepção do som é alterada pelo ambiente, como densidade de subosque, áreas com cachoeiras, barreiras físicas, vale entre serras, enfim, as características ambientais influenciam tanto nas observações visuais quanto nas auditivas.
A distância do passarinho é outro fator que pode dificultar suas escutas e também as gravações, justamente porque as ondas sonoras sofrem efeitos de propagação, como já mencionei. Outro fenômeno que ocorre com o som é a refração, que é a alteração na frequência das notas, ocasionadas por alguma barreira física, pode ser uma parede ou uma vegetação densa.
Imagine, você está próximo de um lago e na sua frente há uma “moita” de Calliandra, toda florida e de repente o joão-teneném (Synallaxis spixi) percebe sua presença e começa a aproximar-se cantando (curioso ou bravo, você decide, a imaginação é sua).
Quem já passou por algo assim sabe que há momentos que parece que o joão-teneném está perto demais e em outros, longe. Serão vários indivíduos? Nem sempre. Isso acontece porque algumas notas são abafadas e outras ressaltadas e isso dificulta a vida para achar o passarinho. Culpa da refração.
Também há o oposto, por exemplo, quando um bem-te-vi (Pitangus sulphuratus) começa a cantar pousado em ponto alto (como um poste ou uma árvore) e o som se propaga, ocorre o que chamamos de eco (reflexão do som). Quem nunca ficou feito “barata tonta”, olhando para o céu no meio da rua, tentando achar de onde está vindo o canto? Assumo, faço isso sempre.
Tá vendo, isto não é uma deficiência pessoal e exclusivamente sua, compartilhe a responsabilidade com a física (hehehe) e persista. Faço essa brincadeira pra você lembrar que o som sofre alterações devido às características ambientais. O que pode otimizar ou prejudicar as suas gravações e/ou escutas.
Similaridade entre os cantos de diferentes espécies
Este fator pode levar a erros de identificação e ouvir as gravações submetidas nas plataformas digitais como Xeno-Canto, WikiAves, Biofaces e ou eBird é um treino muito importante para acostumar os ouvidos.
A escuta é primordial, mas compreender um sonograma (espectrograma) é um baita diferencial para nós observadores de aves. Assim, faço o convite, leia este artigo completo para começar sua alfabetização na linguagem das aves!
Afinal, o que é um espectrograma?
É a representação gráfica do som, basicamente é a imagem da vocalização do passarinho, este “desenho” mostra a frequência em kHz (eixo Y) e o tempo em segundos (eixo X).
O gráfico ilustra a fonética das aves que podem ser divididas em nota, sílaba e frase.
A nota é o menor elemento do som, já a sílaba, é o conjunto de uma ou mais notas que seguem um padrão, somado ao pequeno intervalo entre as notas.
A frase é o conjunto de sílabas, que se encerra quando o padrão de sílabas é alterado ou quando os intervalos são maiores.
Normalmente, nas pesquisas acadêmicas sobre bioacústica das aves, os pesquisadores fazem muitas análises estatísticas para verificar o padrão dos sons emitidos por determinadas espécies. Entretanto, o objetivo aqui é simplificar a linguagem científica e apresentar como você pode “ler” os sons dos passarinhos.
Por essa razão, apresento apenas duas “imagens de cantos” de espécies distintas, que geram dúvidas quando estamos no campo. Tive o cuidado de representar gravações que foram realizadas no mesmo município (Campos do Jordão, SP), isso porque as aves tem sotaque.
O espectrograma 1 é o canto do grimpeiro (Leptasthenura setaria), e o 2 é do arredio-pálido (Cranioleuca pallida). Quando ouvimos ambos, percebemos que os cantos são trinados e como a frequência das notas estão próximas e o timbre é parecido, somente escutar causa a confusão, mas quando “enxergamos” os cantos, dá para perceber como eles apresentam diferenças.
Repare que o grimpeiro emite mais notas nas sílabas e que elas seguem uma harmonia.
A entonação das notas do arredio-pálido é mais aguda (compare as frequências) e essa espécie geralmente apresenta um “pico” na segunda nota, resultando em mais oscilações em cada sílaba.
Essas espécies sempre levantaram dúvidas para mim, até eu conseguir “ler” um sonograma, como apresentei aqui e com isso consegui superar essa dificuldade que tinha durante os trabalhos de campo.
Para compreender um pouco mais sobre a comunicação das aves, assista este vídeo em nosso canal, aproveite para fazer sua inscrição e ativar o sininho, pois quando estivermos ao vivo você receberá uma notificação do YouTube!
Espero ter contribuído em seus estudos ornitológicos.
Aguardo seu like e sua inscrição.
Desejo bons ventos para sua passarinhada.
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